19 maio 2006

CÓRREGOS

(autobiografia - parte 3.301 de 14.600)

Minas Gerais não tem mar, isso é mais do que sabido, no entanto, ali na região do Triângulo Mineiro tem fartura de água doce. É tanto rio, ribeirão, riacho e córrego que é bem capaz de fazer inveja a qualquer região praiana. A vila em que eu morava era rodeada por água, parecia uma ilha. Além de freqüentar muito o Rio Paranaíba e o Rio Grande, que são os rios principais, algumas vezes a família inteira ia passar o domingo na beira do Rio São Domingos, ou então no Alencastro, raramente no Santa Rosa. Tinha vez de ir mais longe ainda, no Rio Bonito, então íamos de Perua. O pai tinha uma Rural, da Willis, e quando o tempo estava bom combinava de dividir combustível com outra família. Enchia a carroceria de moleques, tralhas de pesca, comidas, panelas, panos. A gente fazia festa o tempo inteiro e nem percebia que as mães sofriam nesses passeios. Saíamos de madrugada e voltávamos na boca da noite. Na volta era um cheiro de peixe dentro da perua! Só mesmo para maltratar as mães mais um pouco. Nas redondezas da vila, menos de meia légua para qualquer lado, ainda tinha uma infinidade de córregos! Cada qual com a sua função: O córrego do Chapéu era o melhor para nadar e bom de pescar Piau, Piapara e Piauçú. Isca para essas qualidades de peixes é milho verde, então a gente levava um caniço e uma espiga para disfarçar - que a mãe via perigo na fundura do córrego, e ficava mesmo era nadando a tarde inteira. Depois jogava a isca e tirava meia dúzia de Piaus e voltava para casa dizendo que o dia não estava para peixe. O córrego dos Cordeiros era o mais perto da vila e também o mais movimentado, por isso não servia para nadar nem para pescar, mas tinha serventia! Fornecia água para lavar roupas, porém, isso só do lado de cima da estrada! No lado de baixo passava cavaleiro toda hora, de vez em quando uma boiada, e sujava tudo. Eu tinha para mim que se soubessem, os cavalos e bois não beberiam água de sabão feito em casa com bucho de porco e soda, e que era uma judiação deixar os animais na inocência bebendo bucho derretido. Nunca gostei muito do córrego dos Cordeiros! O córrego do Calais era bom de pescar Lobó, Traíra e também dava para caçar Paturi no meio do brejo. O pai dizia que por ali tinha jacaré amoitado, então a gente evitava ir lá. O xodó da vila era mesmo, pelo menos para nós, moleques, o córrego da Serraria. Se lá no Chapéu tinha um poço fundo de água limpa e gelada, bom pra mergulhar de cima dos troncos, ali na Serraria era razinho e não oferecia perigo algum. Tinha até areia na margem de cá. Na margem de lá era uma pirambeira só. A gente nem precisava mentir para a mãe, todo mundo sabia que o “córgo da serraria” era lugar da molecada brincar e pegar Lambari com peneira. A mãe nem ligava se a gente dizia que ia nadar lá. Quando era tempo de cheia todas as águas ficavam barrentas e então a festa era pegar Bagres e encardir calções. A mãe não gostava não. Nessas épocas todas as mães da vila proibiam os filhos de nadarem. Ai de quem pegava caniço ou peneira dizendo que ia pescar! Daí a gente mentia que ia para outro canto, fazer outras coisas, e ia pra serraria nadar pelado!

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