06 maio 2011

BULINDO COM O PASSADO

Surgiu do nada, na mesma calçada, felina, simulando que andava em direção oposta a minha. Parou dois passos antes de nos cruzarmos, sorriu um excesso de batom e levantou a saia mostrando as ancas branquelas:

- Vamos fazer neném meu bem?

Lembrei a Firmina, mãe da Rosa, ofertando as coxas roliças abertas e nuas. Rosa dormia no berço plantado na penumbra do quarto minúsculo e Firmina trabalhava. Moço, desejos em formação e ainda acertando o cabresto nos pudores, eu pagava pelo prazer que obtinha dentro das coxas da mãe solteira. Por vezes o bebê acordava e me esquadrinhava num vigiar redondo, mesmo quando vestido eu me sentia nu. Baixava a cabeça incapaz de sustentar o peso daquele olhar e ia embora, querendo nunca mais voltar para o meio das coxas redondas da Firmina.

Nunca ouvi choro, resmungo ou riso saindo do berço onde Rosa estava plantada.

Nunca lhe dirigi um carinho, uma graça, um guti-guti. Nada. Não me atrevia, ou não deu tempo. Antes que a menina aprendesse a falar o avô veio buscá-la. Arrancou Rosa dos panos puídos e a levou. Não se importou com o rasgo feito no peito da filha, a Firmina de coxas roliças. Não dei razão a nenhuma das partes e continuei apartando as coxas de Firmina. Meus desejos de moço pungiam o meio das coxas que foram afinando, afinando e deixando de ser as coxas de Firmina. Afinou tanto que Firmina também deixou de ser Firmina. Cada um na vila tinha uma opinião, se um dizia que foi moléstia, outro dizia que foi desgosto... disseram que foi um monte de coisas, só eu não disse nada. E talvez fosse o único que soubesse a verdade. Tinha sido de rasgo no coração. Rasgo que só a presença de Rosa, plantada no canto do quarto, poderia costurar.

- Então, vamos fazer neném?

Retornei da viagem ao passado e recusei com simpatia, mantendo olhos gulosos na curva murcha dos seios brancos. Eu não queria um filho parecido com Rosa! Flor brotando na fenda da guia e fixando raízes na calçada!

A mulher insistiu, me pegou a mão, chamou de meu bem, regateou no preço e eu pensava em Rosa sem mãe lá na vila, "Já é moça feita! Deve ter um belo par de olhos redondos". A felina ajeitou a saia, fez um muxoxo de desprezo e se foi. Eu não me importei. Devidamente cabresteados meus desejos já seguiam a trote curto os pensamentos que estavam em Rosa... "Deve ter coxas roliças, igual a mãe".

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